Resolução n.º 5798
CONSULTA. PARTIDO. SUSPENSÃO DE ANOTAÇÃO PARTIDÁRIA. CONTAS NÃO PRESTADAS. PRESCRIÇÃO.
Requisitos de Admissibilidade
1. Cabe à justiça eleitoral responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas, em tese, por autoridade pública ou partido político, conforme art. 30, VIII do Código Eleitoral.
2. O consultante cumpriu todos os requisitos. Consulta conhecida.
Suspensão de Registro Partidário
3. A previsão da suspensão do registro partidário como sanção ao julgamento das contas como não prestadas já existia e estava em vigor antes da regulamentação do procedimento específico para tal fim, é perfeitamente cabível ações que tenham como objeto contas julgadas não prestadas com trânsito em julgado em data anterior a 03/12/2021.
4. Podem ser objeto do procedimento regulado pelo art. 54-N da Resolução nº 23.662/2021 as contas partidárias anuais do exercício de 2015 e 2018 em diante e das contas eleitorais de 2016 em diante, que tenham o trânsito em julgado a partir de 01/01/2015.
5. Não cabe a prescrição ou decadência das contas julgadas como não prestadas passíveis de serem objeto do procedimento de suspensão do órgão partidário, ante a ausência de previsão legal.
6. Consulta conhecida e respondida nos termos da fundamentação.
RESOLVEM os Juízes Membros do Tribunal Regional Eleitoral do Pará, à unanimidade, conhecer e responder a consulta, nos termos do voto da Relatora, a Juíza Rosa de Fátima Navegantes de Oliveira. Votaram com a Relatora o Desembargador José Maria Teixeira do Rosário, o Juiz Federal José Airton de Aguiar Portela e os Juízes Marcus Alan de Melo Gomes, Rafael Fecury Nogueira e Tiago Nasser Sefer. Presidiu o julgamento o Desembargador Leonam Gondim da Cruz Júnior.
Sala das Sessões do Tribunal Regional Eleitoral do Pará.
Belém, 12 de março de 2024.
Juíza Rosa de Fátima Navegantes de Oliveira
Relatora
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO PARÁ
CONSULTA (11551) - 0600263-81.2023.6.14.0000 - Belém - PARÁ.
CONSULENTE: PARTIDO DOS TRABALHADORES DIRETÓRIO REGIONAL DO PARÁ.
RELATÓRIO
A Senhora Juíza Rosa de Fátima Navegantes de Oliveira: Trata-se de Consulta formulada pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES- PT - Diretório Estadual do Pará (ID 21480919), referente ao tema “suspensão de anotação de instância partidária, especificamente sobre contas partidárias não prestadas e nova redação prescrita no art. 54-N da Resolução 23.662/2021”.
Foram questionadas 3 (três) situações conforme se observam abaixo:
Diante das provocações em tese apontadas pelo requerente, o Ministério Público Eleitoral apresentou seu parecer (ID 21486272).
Em seguida, o setor técnico desta justiça especializada “ASCONT”, emitiu parecer técnico sobre as questões controvertidas (ID 21493969).
Por fim, os autos vieram conclusos para decisão (ID 21494119).
É o relatório.
VOTO
A Senhora Juíza Rosa de Fátima Navegantes de Oliveira (Relatora): Os requisitos para o processo de consulta estão presentes nos artigos 30, inciso VIII, do Código Eleitoral e no artigo 172 do Regimento Interno do TRE/PA, a saber:
Código Eleitoral:
Art. 30. Compete, ainda, privativamente, aos Tribunais Regionais:
VIII - responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas, em tese, por autoridade pública ou partido político
Regimento Interno do TRE/PA:
Art. 172. O Tribunal responderá às consultas sobre matéria eleitoral formuladas em tese, por autoridade pública ou partido político, sendo vedada a sua apreciação durante o processo eleitoral.
Consequentemente, as consultas formuladas à Justiça Eleitoral devem atender aos seguintes requisitos:
a) Tratar a consulta sobre matéria eleitoral formuladas em tese;
b) Ser realizada por autoridade pública ou partido político; e,
c) As consultas não poderão ser apreciadas durante o processo eleitoral.
No caso ora em exame, a Consulta preenche todos os requisitos elencados pela legislação:
a) Trata-se de pergunta atinentes à matéria eleitoral formulada em tese e de maneira genérica, uma vez que não se pode relacionar as perguntas feitas com algum caso concreto em específico;
b) Foi realizada por parte legítima: o diretório estadual do Partido dos Trabalhadores - PT;
c) A parte protocolou o pedido de Consulta em período não eleitoral;
Dessa maneira, visto que todos os pressupostos de admissibilidade estão presentes, a consulta em tela deve ser conhecida.
Isso posto, passamos à análise do mérito.
O partido consulente busca esclarecimento a respeito de 3 (três) perguntas:
1) Tendo essa Resolução do TSE que criou a possibilidade da apresentação do requerimento de suspensão da anotação da instância partidária entrado em vigor em 18 de novembro de 2021, o requerimento previsto no art. 54-N poderá ter por objeto Prestações de Contas julgadas como não prestadas com trânsito em julgado em data anterior a edição dessa norma (aplicação retroativa), ou poderá ser aplicada apenas em relação aquelas que transitarem em julgado em data posterior àquela data?
2) Se a resposta for pela possibilidade de aplicação retroativa, até que data de trânsito em julgado poderá retroagir contando a partir do dia 18 de novembro de 2021?
3) Em qual período se efetivará a prescrição em relação a decisões transitadas em julgado após o dia 18 de novembro de 2021, tomando por base a data de protocolização do requerimento?
Inicialmente é importante ressaltar que o cancelamento do registro partidário foi primeiramente previsto na Lei dos Partidos Políticos, em seu art. 28, III, no entanto tal entendimento estava direcionado apenas para a esfera federal. Os órgãos regionais, municipais ou zonais também ficarão sujeitos à suspensão de sua anotação perante a justiça eleitoral, como sanção quando do julgamento das suas contas como não prestadas, somente com a publicação, pelo Tribunal Superior Eleitoral, da Resolução nº 23.432/2014, com vigência a partir de 01/01/2015, que irá disciplinar a matéria em seu art. 47, § 2:
Art. 47. A falta de prestação de contas implica a proibição de recebimento de recursos oriundos do partidário, enquanto não for regularizada a situação do partido político.
§ 2º Julgadas não prestadas as contas dos órgãos regionais, municipais ou zonais, serão eles e os seus responsáveis considerados, para todos os efeitos, inadimplentes perante a Justiça Eleitoral e o registro ou anotação dos seus órgãos de direção e ficará suspenso até a regularização da sua situação.
Seguindo na mesma linha, o TSE publicou a Resolução 23.546/2017 e a Resolução nº 23.571/2018 que, respectivamente, no art. 48, II, e art. 42, caput, preveem a mesma punição às instâncias partidárias que obtiverem o julgamento das suas contas como não prestadas, a saber:
Res./TSE 23.546/2017
Art. 48. A falta de prestação de contas implica a proibição de recebimento de recursos oriundos do Fundo Partidário, enquanto não for regularizada a situação do partido político.§2º O órgão partidário, de qualquer esfera, que tiver as suas contas julgadas como não prestadas fica obrigado a devolver integralmente todos os recursos provenientes do Fundo Partidário que lhe forem entregues, distribuídos ou repassados, bem como terá suspenso o registro ou a anotação, no caso de órgão de direção estadual ou municipal.
Res./TSE 23.571/2018:
Art. 42. Será suspenso o registro ou a anotação do órgão de direção estadual ou municipal que tiver suas contas partidárias julgadas como não prestadas, devendo o órgão ser inativado e novas anotações indeferidas até que seja regularizada a situação.
Dessa maneira, com o estabelecimento da suspensão partidária como consequência da não prestação de contas, houveram dúvidas a respeito de que maneira se daria a aplicação da sanção: se ocorreria de forma imediata após o julgamento das contas como “não prestadas” ou obedeceria um procedimento próprio. Nesse contexto, o Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 6.032/DF estabeleceu que a interpretação constitucional da suspensão da anotação de órgão partidário estadual, regional, municipal ou zonal não pode ocorrer de forma automática após o julgamento das contas como “não prestadas”, mas somente pode ser aplicada após decisão, com trânsito em julgado, decorrente de procedimento específico de suspensão de registro.
Assim, para a suspensão da anotação do partido é essencial que haja o trânsito em julgado da decisão que julgou as contas como não prestadas, além de realização de um procedimento específico para esse fim.
Seguindo essa tônica, o TSE editou a Resolução nº 23.662/2021 que no art. 54-N regulamenta o procedimento para a suspensão do registro do órgão partidário estadual, regional, municipal ou zonal como resultado do julgamento das contas como “não prestadas”.
Em síntese, apesar da suspensão de registro para órgãos partidários abaixo da direção nacional está prevista desde 01/01/2015, o regulamento para aplicação de tal sanção somente foi regulamentado com a publicação da Resolução TSE 23.662 que entrou em vigor em 03/12/2021.
A dúvida do consultante reside na questão se o procedimento criado pela corte em 2021 pode ser utilizado para decisões com trânsito em julgado antes da data de sua vigência, 03/12/2021.
Ora, diante do exposto tem-se que a sanção está em vigor desde 01/01/2015, somente os moldes legais de como ocorrerá eventual representação para fins de suspensão foi descrito pela Resolução TSE nº 23.662/2021. Dessa maneira, uma vez que a previsão da punição já existia e estava em vigor antes da regulamentação do procedimento específico para tal fim, é perfeitamente cabível ações que tenham como objeto contas julgadas não prestadas com trânsito em julgado em data anterior a 03/12/2021, visto a punição já estar prevista. Soma-se a esse entendimento o fato de que a não apresentação das contas é uma situação que permanece no tempo até a devida apresentação, logo as consequências devem permanecer até que sejam alteradas as condições que ensejaram esta situação.
Em seguida, no que se refere às datas das prestações de contas que podem ser objeto do pedido de suspensão do órgão partidário, é imprescindível notar que a Res. TSE nº 23.432/2014 é a resolução aplicável materialmente às contas partidárias anuais do exercício de 2015, tendo as resoluções seguintes 23.546/2017 (aplicável ao exercício de 2018 e 2019) e 23.604/2019 (aplicável ao exercício de 2020 e seguintes), mantido expressamente a implicação de suspensão do registro ou a anotação, no caso de órgão de direção estadual ou municipal que tivessem as contas julgadas não prestadas.
No entanto, a Res. TSE nº 23.464/2017, aplicável aos exercícios de 2016 e 2017, restou silente quanto a punição de suspensão do órgão partidário quando da não prestação de contas, vejamos:
Art. 48. A falta de prestação de contas implica a proibição de recebimento de recursos oriundos do Fundo Partidário, enquanto não for regularizada a situação do partido político.
§ 1º Julgadas não prestadas as contas do órgão nacional do partido, o Tribunal Superior Eleitoral deve encaminhar os autos ao Ministério Público Eleitoral para os fins do art. 28, III, da Lei nº 9.096 , de 1995.
§ 2º O órgão partidário, de qualquer esfera, que tiver as suas contas julgadas como não prestadas fica obrigado a devolver integralmente todos os recursos provenientes do Fundo Partidário que lhe forem entregues, distribuídos ou repassados.
Dessa maneira, uma vez que a sanção não foi expressamente prevista em tal instrumento normativo, entende-se que a prestação de contas anuais dos anos a que se refere (2016 e 2017) não podem ser objeto do procedimento objetivando a suspensão do registro partidário como consequência do julgamento das contas como não prestadas.
Por outro lado, com relação às contas eleitorais, a previsão de suspensão do registro do órgão de direção estadual ou municipal está prevista desde a Resolução TSE nº 23.465/2015, portanto, desde as eleições 2016, tendo sido mantido na Resolução TSE nº 23.553/2017 e na Resolução TSE nº 23.607/2019.
Assim, entendo que poderiam ser objeto do procedimento regulado pelo art. 54-N da Resolução nº 23.662/2021 as contas partidárias anuais do exercício de 2015 e 2018 em diante e das contas eleitorais de 2016 em diante, que tenham o trânsito em julgado a partir de 01/01/2015.
Por fim, no que tange a última pergunta do partido, sobre como se daria a prescrição das decisões transitadas em julgado, tomando por base a data de protocolização do requerimento, é importante a análise da Resolução TSE nº 23.604/2019. No art. 48 desse instrumento normativo está disposto sobre a prescrição quinquenal em contas julgadas desaprovadas. Por outro lado, não há previsão de prescrição de sanção para contas julgadas não prestadas, pois como citado, a não apresentação das contas é uma situação que permanece no tempo até a devida apresentação, conforme art. 47 c/c art. 58, §4º da mesma resolução. Dessa maneira, não se pode falar em prescrição ou decadência.
Ante o exposto, CONHEÇO da consulta, e quanto ao ITEM 1 respondo que uma vez que a previsão da suspensão do registro partidário como sanção ao julgamento das contas como não prestadas já existia e estava em vigor antes da regulamentação do procedimento específico para tal fim, é perfeitamente cabível ações que tenham como objeto contas julgadas não prestadas com trânsito em julgado em data anterior a 03/12/2021.
No que se refere ao ITEM 2, respondo que, com base na previsão legal da punição nas respectivas resoluções, entendo que poderiam ser objeto do procedimento regulado pelo art. 54-N da Resolução nº 23.662/2021 as contas partidárias anuais do exercício de 2015 e 2018 em diante e das contas eleitorais de 2016 em diante, que tenham o trânsito em julgado a partir de 01/01/2015.
A respeito do ITEM 3, respondo que visto que não há previsão de prescrição da sanção para contas julgadas não prestadas, pois como citado, a não apresentação das contas é uma situação que permanece no tempo até a devida apresentação, conforme art. 47 c/c art. 58, §4º da mesma resolução, depreende-se que não se pode falar em prescrição ou decadência.
É o voto.
Belém, 12 de março de 2024.
Juíza Rosa de Fátima Navegantes de Oliveira
Relatora