Resolução n.º 5768
PETIÇÃO. ASSEMBLEIA LEGISLATIVA. PLEBISCITO. CONSULTA POPULAR. DESMEMBRAMENTO DE DISTRITO. CRIAÇÃO DE MUNICÍPIO. MONTE DOURADO. ARTIGO 18 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AUSÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE DA REALIZAÇÃO DA CONSULTA PLEBISCITÁRIA. NÃO CONHECIMENTO DO PEDIDO.
1. A Lei 9.709/98, que regulamenta a execução dos incisos I, II e III do artigo 14 da Constituição Federal, dispõe que a convocação do plebiscito pela Assembleia Legislativa está condicionada à observância da conformidade da legislação federal e estadual.
2. A ausência de lei complementar federal mencionada pelo §4º, do artigo 18, da Constituição Federal, impossibilita a realização de consulta plebiscitária para a criação de municípios.
3. Pedido de consulta plebiscitária não conhecido.
RESOLVEM os Juízes Membros do Tribunal Regional Eleitoral do Pará, por unanimidade, não conhecer do pedido, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator o Desembargador José Maria Teixeira do Rosário, a Juíza Federal Carina Cátia Bastos de Senna e os Juízes Álvaro José Norat de Vasconcelos, Diogo Seixas Condurú e Rafael Fecury Nogueira. Presidiu o julgamento o Desembargador Leonam Gondim da Cruz Júnior.
Sala das Sessões do Tribunal Regional Eleitoral do Pará.
Belém, 21 de março de 2023.
Juiz Edmar Silva Pereira
Relator
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO PARÁ
PETIÇÃO CÍVEL (241) - 0600167-03.2022.6.14.0000 - Almeirim - PARÁ.
INTERESSADO: ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO PARA.
RELATÓRIO
O Senhor Juiz Edmar Silva Pereira: Trata-se de Ofício encaminhado pela Assembleia Legislativa do Estado do Pará solicitando a realização de consulta plebiscitária no município de Almeirim, para a criação do município de Monte Dourado.
Instado a se manifestar, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou (ID 21096603) pelo não conhecimento do pedido e, caso conhecido, pelo seu indeferimento alegando que “o pedido não deve ser conhecido, por ausência de cumprimento de um dos requisitos constitucionais para o desmembramento de município, qual seja: a edição de lei complementar federal, sendo, inclusive, caso de julgamento monocrático pelo relator, consoante prevê o Regimento Interno do TRE/PA”.
Em despacho (ID 21098447), este relator informou não existir nos autos nenhum dos documentos que comprove o cumprimento dos requisitos insculpidos no art. 2º e incisos da Lei Complementar Estadual nº 074/2010, determinando que aquela Casa Legislativa apresentasse os referidos documentos, tendo sido apresentado diversos documentos, conforme anexos de petição de ID 21146369.
É o relatório.
VOTO
O Senhor Juiz Edmar Silva Pereira (Relator): Conforme relatado, trata-se de Pedido para a realização de consulta plebiscitária para a criação de município.
Ab initio, ressalto que a EC n.º 15/96 deu nova redação ao parágrafo 4.º, do artigo 18, da Constituição Federal, que dispõe sobre a criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de municípios, determinando que esses atos só poderão ser confirmados com a edição de lei estadual, em período determinado por lei complementar federal, após estudos de sua viabilidade, dependendo ainda de consulta prévia às populações dos municípios envolvidos, por meio de plebiscito. In litteris:
Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição. (…).
§ 4º A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período determinado por Lei Complementar Federal, e dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei (destacou-se).
Esta Corte, no julgamento da Petição n° 0600021-64.2019 que tratava sobre o pedido para a realização de plebiscito no Distrito de Castelo dos Sonhos, no Município de Altamira, assentou o entendimento de que, em que pese a não edição de lei complementar federal, a competência da Justiça Eleitoral quando já há decisão da Assembleia Legislativa para realização de plebiscito em municípios, restringe-se aos procedimentos de preparação do pleito, a teor dos incisos I, II, III, IV do art. 8° da Lei n° 9.709/1998.
Vale ressaltar que a competência para a efetiva criação do município é do Poder Legislativo Estadual, da Assembleia Legislativa do Estado do Pará, por meio da Lei Estadual que determinará a referida criação, da forma prevista no §4° do art. 18 da Constituição Federal, não dependendo explicitamente de autorização judicial.
Nesse sentido, o aspecto da criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios, antes da Lei Complementar Federal que se refere o §4° do art. 18, bem como antes da efetiva criação de lei Estadual que autorize o desmembramento e criação do novo município, restringe-se a apreciar a observância dos requisitos previstos na ordem jurídica em vigor, uma vez que, cumpridos os requisitos da elaboração do estudo da viabilidade municipal e da realização do plebiscito, poderá a Assembleia Legislativa do Pará aguardar a tão almejada promulgação da Lei Complementar Federal e, aproveitando os atos e pressupostos constitucionais já praticados, repise-se, estudo de viabilidade municipal e plebiscito, editar Lei Estadual autorizativa de desmembramento e criação do novo município.
A propósito, o Supremo Tribunal Federal decidiu, na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.992 – Rondônia, em 11 de setembro de 2014, da seguinte forma:
Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Lei 2.264/2010, do Estado de Rondônia, que dispõe sobre a criação do Município de Extrema de Rondônia, a partir de desmembramento de área territorial do Município de Porto Velho, fixa os seus limites, bem como informa os Distritos que integrarão a municipalidade criada. 3. Autorização, pelo Tribunal Superior Eleitoral, apenas para realização de consulta plebiscitária. 4. Violação ao art. 18, § 4º, da Constituição Federal. Inexistência de Lei Complementar Federal. Impossibilidade de criação, fusão, incorporação ou desmembramento de novos municípios antes do advento dessa legislação. Precedentes. 5. A Emenda Constitucional n.º 57/2008 não socorre a lei impugnada, editada no ano de 2010. 6. Medida cautelar confirmada. 7. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente.
(STF - ADIn: 4.992, Relator: Ministro GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 11/09/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-223 DIVULG 12-11- 2014 PUBLIC 13-11-2014).
Veja-se, pela referida decisão, que o Tribunal Superior Eleitoral apenas autorizou a realização do plebiscito, ficando impossibilitada a criação do ente político ante a ausência de Lei Complementar Federal.
No respectivo voto da ADI, o Min. Gilmar Mendes assim consigna:
[...] Impende realçar, mais uma vez, que não estará o Tribunal Superior Eleitoral autorizando a criação do município, tema que não se inclui no âmbito de sua competência, mas apenas, em consonância com o decidido na origem, viabilizando a realização de consulta prévia.
Dessa forma, compete à Justiça Eleitoral, verificar o cumprimento dos requisitos legais para, então, autorizar a consulta popular, mas cuja criação do município ficará a cargo da Casa Legislativa Estadual, após sanção de lei complementar federal.
Após as considerações iniciais, registro que o presente caso diz respeito ao pedido de realização de consulta plebiscitária para a criação do município de Monte Dourado, requerido pela Assembleia Legislativa do Pará, nos termos da Lei Complementar Estadual n.º 74/2010.
Todavia, tendo em vista a ausência de Lei Complementar Federal que discipline a criação de municípios, não é possível conhecer do pleito formulado pela Assembleia Legislativa do Estado do Pará para a criação do referido município.
A razão para a não apreciação do pleito encontra-se na inconstitucionalidade formal do ato administrativo, uma vez que a criação de novos municípios é questão complexa que demanda regulamentação por Lei Complementar Federal, conforme disposto no artigo 18, § 4º, da Constituição Federal.
Ademais, a Lei 9.709/98 condiciona a convocação de plebiscito à observância da conformidade da legislação federal e estadual, tornando inviável a realização da consulta plebiscitária para a criação de municípios sem a edição da referida Lei Complementar Federal.
Diante do exposto, e acompanhando o parecer ministerial, voto pelo NÃO CONHECIMENTO do pedido de consulta plebiscitária requerido pela Assembleia Legislativa do Estado do Pará para a criação do município de Monte Dourado, em razão da inexistência de Lei Complementar Federal que discipline a matéria e da impossibilidade de realizar a consulta plebiscitária sem observar as normas constitucionais e legais aplicáveis.
É como voto.
Belém, 21 de março de 2023.
Juiz Edmar Silva Pereira
Relator
* Este texto não substitui o publicado no DJE TRE-PA, de 29/03/2023