Resolução n.º 5795

CONSULTA ELEITORAL. POSSIBILIDADE DE REALIZAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO EM ANO ELEITORAL. QUESTIONAMENTOS DIRIMIDOS PELA MERA LEITURA DO TEXTO LEGAL. NÃO CONHECIMENTO.

1. O conhecimento de uma Consulta Eleitoral exige a presença de quatro elementos básicos, quais sejam: a) tratar de matéria eleitoral; b) veicular questão em tese ou em abstrato, não atrelada a caso concreto; c) ser realizada em período não eleitoral; d) ser deduzida por autoridade pública ou partido político.

2. Pelo teor do pleito do consulente, é possível constatar que os quesitos por ele formulados podem ser deduzidos da simples leitura do texto normativo do art. 73, inciso V, alínea “c”, da Lei nº 9.504/97, quanto à possibilidade de realização de concurso público em ano eleitoral.

3. Consulta que não deve ser conhecida.

RESOLVEM os Juízes Membros do Tribunal Regional Eleitoral do Pará, por maioria, não conhecer da consulta, nos termos do voto do divergente do Juiz Tiago Nasser Sefer, que foi acompanhado pelos Juizes Edmar Silva Pereira e Rosa de Fatima Navegantes. Vencido o Relator, o Juiz José Maria Rodrigues Alves Junior, que foi acompanhado pelo Juiz Federal José Airton de Aguiar Portela. Ausentou-se ocasionalmente o Desembargador Leonam Gondim da Cruz Júnior. Presidiu o julgamento a Desembargadora Maria Filomena de Almeida Buarque.

Sala das Sessões do Tribunal Regional Eleitoral do Pará.

Belém, 24 de janeiro de 2024.

Juiz Tiago Nasser Sefer

Relator Designado

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO PARÁ

CONSULTA (11551) - 0600255-07.2023.6.14.0000 - Belém - PARÁ

CONSULENTE: CAMARA MUNICIPAL DE BELEM

RELATÓRIO

O Senhor Juiz José Maria Rodrigues Alves Júnior (Relator Originário): Cuidam os autos de consulta eleitoral realizada pelo presidente da Câmara Municipal de Belém, John Wayne, acerca das seguintes questões: (i) É possível a realização de concurso público para provimento de vaga em ano eleitoral; (ii) Em caso de resposta positiva, o certame poderia estender-se até o período vedado pelo artigo supracitado?; (iii) Nos casos de concursos homologados antes do trimestre que antecede a eleição, as nomeações dos aprovados poderiam ser realizadas no mesmo ano?.

Os autos foram remetidos à Procuradoria Regional Eleitoral, que, à luz da interpretação da legislação eleitoral, manifestou-se (ID 21478423) pelo "sim" acerca das indagações dispostas na consulta eleitoral.

É o relatório.

VOTO

O Senhor Juiz José Maria Rodrigues Alves Júnior (Relator Originário): O Código Eleitoral e o Regimento Interno deste Tribunal regulam o procedimento da Consulta Eleitoral, nos seguintes termos:

Código Eleitoral

Art. 30. Compete, ainda, privativamente, aos Tribunais Regionais:

[...]

VIII - responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas, em tese, por autoridade pública ou partido político;

Regimento Interno do TRE/PA

Art. 71. Compete ainda ao Tribunal:

[...]

X - responder sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas, em tese, por autoridade pública ou Partidos Políticos;

Art. 172. O Tribunal responderá às consultas sobre matéria eleitoral formuladas em tese, por autoridade pública ou partido político, sendo vedada a sua apreciação durante o processo eleitoral.

O conhecimento de uma Consulta Eleitoral exige, portanto, a presença de quatro elementos básicos, quais sejam: a) tratar de matéria eleitoral; b) veicular questão em tese ou em abstrato, não atrelada a caso concreto; c) ser realizada em período não eleitoral; d) ser deduzida por autoridade pública ou partido político.

Nota-se que a matéria é evidentemente eleitoral, por indagar acerca de conduta vedada aos agentes públicos em período eleitoral, ter sido veiculada de forma genérica e impessoal, pelo presidente da Câmara Municipal de Belém e fora do período eleitoral, merecendo conhecimento e processamento.

Adentrando ao mérito das questões, passemos à leitura do art. 73, inciso V, alínea "c", da Lei nº 9.504/97.

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

V - nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados:

[...]

c) a nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até o início daquele prazo;

Com a interpretação do dispositivo legal, infere-se que é possível a realização de concurso público até o último dia dos três meses anteriores à data das eleições. Além disso, o artigo também dispõe sobre a nomeação dos aprovados no certame, que poderá ocorrer durante o período vedado.

Desse modo, constata-se que sim, é permitida a realização de concurso público, que pode até mesmo se estender durante o período vedado pela legislação eleitoral, no entanto, a nomeação dos aprovados depende de ter ocorrido a homologação do certame até o último dia anterior aos três meses que antecedem o dia das eleições.

Contudo, é oportuno destacar que a realização de concurso público deve ser vinculada a um motivo, isto é, a Administração Pública precisa demonstrar a necessidade do preenchimento das vagas ofertadas no certame. Dessa forma, é obrigação do poder público a elaboração de cronograma que leve em consideração a ocorrência ou não de eleições durante o ano escolhido, sob pena de praticar atos investidos de ilegalidade.

O manifesto desvio de finalidade na realização de concurso público pode ensejar a procedência de ações eleitorais que visem coibir o abuso de poder político, caso a realização do certame seja revestida de ilicitude apta a macular a regularidade e a legitimidade das eleições. O TSE possui precedente esclarecedor nesse sentido:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CANDIDATO A PREFEITO NÃO ELEITO. ABUSO DO PODER POLÍTICO. REALIZAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO ÀS VÉSPERAS DO PLEITO. DECISÕES. INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. CONFIGURAÇÃO DO ILÍCITO. ALEGAÇÃO. NECESSIDADE DE FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. IMPROCEDÊNCIA. REVISÃO DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE.

[...]

Mérito.

4. No que respeita à matéria de fundo, a Corte de origem assentou a configuração do abuso do poder político em face da conduta do agravante, então prefeito na época dos fatos, consistente na publicação de edital para a realização de concurso público, às vésperas das eleições, para diversos níveis escolares e em diversas áreas (de médico a coveiro), evidenciando a posição de extrema vantagem na disputa eleitoral, considerada, inclusive, a pequena população do município, cuja conclusão sobre a configuração do ilícito não pode ser revista nesta instância especial, a teor do verbete sumular 24 desta Corte Superior. (destacou-se)

5. O abuso do poder político configura-se quando o agente público, valendo-se de sua condição funcional e em manifesto desvio de finalidade, compromete a legitimidade do pleito e a paridade de armas entre candidatos, o que se aplica igualmente às hipóteses de condutas aparentemente lícitas, mas com eventual desvirtuamento apto a impactar na disputa. Agravo regimental a que se nega provimento.

(TSE - AI: 00005185320166100030 CENTRAL DO MARANHÃO - MA 51853, Relator: Min. Sérgio Silveira Banhos, Data de Julgamento: 11/02/2020, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 045)

De acordo com a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a limitação é restrita à circunscrição em que se realiza a eleição, ou seja, se a eleição for municipal, por exemplo, a limitação se refere somente ao município em que o pleito será realizado. E o município fica liberado para desrespeitar a restrição do art. 73, inciso V, alínea c, da Lei nº 9504/97, em caso de eleições para Presidente.

O objetivo do art. 73, inciso V, alínea "c", da Lei nº 9.504/97 é impedir que o administrador realize concurso público como meio de captação de sufrágio, havendo assim a desvirtuação do princípio da eficiência e da real necessidade do certame.

Pelo exposto, verificando-se presentes os requisitos que justificam o conhecimento e processamento da presente consulta eleitoral, VOTO por responder "SIM" aos três questionamentos realizados pelo presidente da Câmara Municipal dos Vereadores de Belém, desde que respeitados os dispositivos da Lei nº 9.504/97.

Belém, 24 de janeiro de 2024.

Juiz José Maria Rodrigues Alves Júnior

Relator Originário

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO PARÁ

CONSULTA (11551) - 0600255-07.2023.6.14.0000 - Belém - PARÁ

CONSULENTE: CAMARA MUNICIPAL DE BELEM

VOTO VENCEDOR

O Senhor Juiz Tiago Nasser Sefer (Relator Designado): A despeito do bem lançado voto do eminente relator, peço vênia para discordar de seu entendimento, ressaltando que a divergência não se dá em razão do conteúdo da resposta à consulta, com a qual eu, particularmente, concordo, mas sim quanto ao cabimento da consulta nessa hipótese, pois me parece que a consulta foi formulada em termos muito objetivamente descritos na lei, sendo as respostas atingíveis pela mera leitura do texto legal.

A jurisprudência eleitoral pátria já se firmou no sentido de que não deve ser conhecida a consulta quando a resposta aos quesitos puder ser obtida pela mera leitura do texto legal e não houver jurisprudência controvertida ou qualquer tipo de óbice à clara interpretação. Nesse sentido, eis o seguinte aresto:

CONSULTA DÚVIDAS A RESPEITO DO ALCANCE DE DISPOSITIVOS DISCIPLINANDO A NECESSIDADE DE EXISTÊNCIA DE ÓRGÃO PARTIDÁRIO NA CIRCUNSCRIÇÃO DO PLEITO PARA REGISTRO DE CANDIDATURA (CE, ART. 90, E LEI N. 9.504/1997, ART. 4°) - INDAGAÇÕES DIRIMIDAS, EM PARTE, PELA MERA LEITURA DA LEI - NÃO CONHECIMENTO - TERMOS JURÍDICOS EQUIVALENTES PREVISTOS EM NORMAS LEGAIS DISTINTAS QUESTÕES CONHECIDAS E RESPONDIDAS EM PARTE.

1. Não se conhece de consulta com indagações que podem ser dirimidas pela mera leitura do texto da lei, tornando despicienda qualquer interpretação da Justiça Eleitoral.

2. O termo "diretório", previsto no art. 90 do Código Eleitoral, deve ser entendido como qualquer órgão diretivo que, em conformidade com as regras do respectivo estatuto partidário, represente a agremiação na circunscrição da eleição e tenha poderes para realizar convenção destinada à escolha de candidatos.

Outrossim, constitui expressão correspondente ao termo "órgão de direção" previsto no art. 4º da Lei n. 9.504/1997. São termos jurídicos equivalentes, destinados a disciplinar idêntica matéria.

[TRESC. Acórdão n. 28.437, de 07/08/2013, Relator Desembargador Luiz Cézar Medeiros - grifei].

Afigura-se, na verdade, que a presente consulta deveria ter sido formulada ao setor jurídico interno da consulente, ou à pessoa que presta assessoria jurídica à Câmara Municipal, não devendo ser objeto de consulta do Tribunal Regional Eleitoral, diante da primariedade dos questionamentos, por assim dizer.

Por tais razões, com todas as vênias ao digno relator, VOTO PELO NÃO CONHECIMENTO DA CONSULTA.

Belém, 24 de janeiro de 2024.

Juiz Tiago Nasser Sefer

Relator Designado

* Este texto não substitui o publicado no DJE TRE-PA, de 20/02/2024

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